Por Fernando Moreira Gonçalves
Nas discussões para elaboração do orçamento de 2013, o governo federal, por meio da presidência da República, sinaliza que mais uma vez não pretende conceder qualquer reajuste aos servidores públicos dos Três Poderes da União. Desde o início do governo Dilma, assim como no último ano do governo Lula, salários e pensões da esmagadora maioria dos servidores públicos estão congelados, e assim entende o governo federal que devem continuar, prognosticando uma redução real de poder aquisitivo dos salários no serviço público nunca antes vista na história deste país.
A ministra chefe da Casa Civil, Miriam Belchior, cita exemplo de países europeus, que estão cortando benefícios de funcionários públicos, para se dizer surpresa com as reivindicações de sindicatos de servidores no Brasil. Repentinamente, descobrimos que estamos na mesma situação de Espanha, Portugal e Grécia, países que se veem na contingência de adotar medidas drásticas de corte de benefícios de servidores públicos, para atender as exigências de credores internacionais. De país impulsionador do crescimento mundial, nos tornamos reféns da mesma lógica que empurra cada dia mais países europeus endividados para a beira do precipício.
Ao reduzir drasticamente o poder de compra de parcela significativa da classe média, composta por assalariados do serviço público, assim como tem sido feito pelos mencionados países europeus, o governo federal dá sua contribuição para a redução do consumo, o enfraquecimento do mercado interno e a ausência de perspectiva de crescimento. As lições de Keynes, sobre a importância de se adotar medidas anticíclicas, por meio do aumento do gasto público em momentos de falta de crescimento da economia, são desprezadas.
Isso tudo poderia ser considerado apenas uma opção equivocada da área econômica, fundada na ideologia imposta por tanto anos pelo FMI ao Brasil, pois, como diz a sabedoria popular, o uso do cachimbo faz a boca torta.
No entanto, os problemas causados por essa opção infeliz do governo federal, de reduzir gastos por meio da redução de salários no serviço público, não se limitam ao campo econômico. Encontra óbice intransponível no texto da Constituição da República, que estabelece a irredutibilidade de vencimentos de funcionários públicos e a revisão geral anual dos salários. Nesse contexto, a falta de reposição inflacionária representa descarada afronta ao texto constitucional.
O governo brasileiro, tão preocupado em seguir as medidas adotadas pelos europeus, deveria informar ao povo brasileiro também sobre os conflitos de rua e manifestações que tem ocorrido diariamente em Madri e Atenas, em decorrência das medidas que agora se pretende repetir em nosso país.
Os instrumentos de repressão às legítimas reivindicações dos servidores públicos já começam a ser brandidos pelo governo federal, como corte de ponto, punição a grevistas, entre outras medidas. Ninguém se iluda. A presidente da República, com um caráter forjado em um passado de lutas contra o regime militar, sabe bem que os instrumentos estatais de repressão pouco podem fazer contra a mobilização de pessoas convencidas da justiça de sua causa.
Desse modo, as opções que se colocam ao governo federal na elaboração da lei orçamentária anual são: a prevalência do bom senso, com a reposição inflacionária de salários corroídos por longo período de congelamento, ou o enfrentamento dos legítimos movimentos reivindicatórios, numa batalha inglória, que deixará graves prejuízos para todos, em especial para a população destinatária dos serviços públicos prestados pelos servidores em luta por reposição inflacionária dos seus salários.
Fernando Moreira Gonçalves é juiz federal em São Paulo e mestre em Direito pela Universidade de Valladolid, Espanha.
Revista Consultor Jurídico, 19 de julho de 2012
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